28 setembro 2007

A economia do trânsito


Caros leitores, hoje vamos aplicar os conhecimentos apreendidos em postas anteriores. Nomeada e mormente vamos juntar esta questão a esta outra. Estamos prontos? Vá lá sugadinhos nos vossos lugares.

Porque é que nunca se consegue resolver o problema do trânsito e das filas intermináveis? Ao analisar as causa do problema é normal encontrar "n" explicações: má concepção das estradas, poucos acessos, semáforos mal regulados, xicos-espertos, estacionamento em segunda fila (o Martim Moniz é um caso único do mundo em que se resoveu o problema empurrando a 2ª fila para a faixa da esquerda), falta de policiamento, má rede de transportes públicos, urbanização intensiva, etc..., etc..., etc... Sem esquecer que estes argumentos têm a sua validade, eles são, no entanto, sintomáticos de uma atitude bem comum que é a de atribuir a culpa aos outros - no governo, na Câmara Municipal, na Polícia, na Carris - esquecendo a quota parte da culpa que nos cabe.

Basicamente o trânsito surge de um desajustamento entre a quantidade de carros existente na cidade e os acessos nesta e para esta. Poder-se-á pensar que se resolve aumentando a quantidade de vias de acesso e aumentando a capacidade das existentes. A experiência diz que em pouco tempo a situação volta ao que era. Melhorando as condições de circulação passa a compensar cada vez mais utilizar o transporte individual; cada vez mais pessoas decidem comprar ou levar o carro todos os dias voltando a intupir o trânsito, entrando-se numa espiral que parece não ter fim.
Este problema pode ser analisado segundo os princípios enunciados nesta minha posta. A razão pela qual as pessoas insistem em trazer o carro para a cidade sabendo que vão enfrentar muito trânsito com elevado grau de probabilidade tem a ver com preferências e percepção. A maior parte destas pessoas não acha o trânsito suficientemente mau a ponto de deixar de trazer o carro, o que denota que as vantagens que este lhe traz compensa as suas desvantagens - esta é uma questão de preferências. Só a partir de uma determinada intensidade de trânsito (muito elevada) é que as pessoas desistem de vir de carro. Por outro lado, as alternativas propostas ao automóvel (transportes públicos ou andar a pé) são percebidas como algo incómodo ou que não resolve o problema da mobilidade (independentemente de isto ser verdade ou não em cada um dos casos).

Tudo para dizer que o problema do trânsito também pode ser atacado ao nível das preferências e da percepção dos utentes e que essas medidas têm uma eficácia e durabilidade - apesar de muito difíceis de implementar - muito superior a medidas avulsas que apenas "tapam o buraco". Ao nível das preferências pode-se convencer as pessoas que passar tanto tempo no trânsito é demasiado estúpido. Talvez isso as faça sentir responsáveis e a sentir-se parte do problema, a questionar as suas opções de vida e com motivação para assumir a sua quota parte da solução. Ao nível da percepção criando alternativas (realmente) eficazes ao ponto de a população sentir que ir de carro não traz assim tantas vantagens face às alternativas disponíveis.