Mercados em Tensão (2)
O modelo actual gera uma rigidez do lado da procura que não se verifica do lado da oferta. Num determinado ano, o custo de produção varia consoante as oscilações dos preços dos combustíveis e os regimes hídricos enquanto que o preço que vigora para o consumidor é fixo.
Quando se transita para um modelo de mercado verdadeiramente livre, as restrições à entrada de empresas produtoras e distribuidoras são levantadas (as que entrarem têm simplesmente de garantir obediência ao regulamento vigente) e os preços passam a variar consoante as leis da procura e oferta.
No meu entender, têm de ser garantidas duas condições para que uma liberalização seja bem sucedida:
1º - A liberalização tem de ser completa. Não é desejável que se levantem as barreiras à entrada de concorrentes e se mantenha o preço fixo ou que se liberalize o preço mas se mantenham as barreiras à entrada. O regulador tem de deixar de ser participante activo no mercado e passar simplesmente a garantir que os regulamentos sejam cumpridos e que as boas práticas de mercado são cumpridas (um papel semelhante ao da CMVM).
O desastre californiano deveu-se ao facto deste ponto não ter sido respeitado: o parque produtor foi liberalizado mas os preços ao consumidor final mantiveram-se fixos. Resultado: o maior incentivo à poupança de energia (o preço) não funcionou, a procura aumentou (os preços assim o convidavam), os potenciais produtores de energia não tinham incentivo a entrar no mercado, e uma parte dos produtores operantes deixaram de ter incentivo a ligar as suas máquinas (o preço recebido era inferior ao custo marginal), a procura excedeu a oferta e o sistema colapsou.*
À luz de notícias recentes, parece que há muita empresa (produtora e distribuidora) que não está disposta a participar no mercado uma vez que o regime fixo de preços é actualmente muito mais apetecível. Aliás, muitos consumidores do regime não vinculado passaram a ir comprar electricidade ao sistema público!
Por outro lado, a liberalização dos preços sem abertura a concorrentes traria seguramente situações de conluio. O conluio em Portugal tem estado bastante à “solta”, como se pode constatar no caso das gasolineiras, sem que ninguém ainda tenha conseguido provar nada.
2º - A liberalização tem de ser progressiva. Tão mais progressiva quanto o impacto dessa liberalização seja prejudicial aos consumidores ou aos produtores. É necessário dar tempo aos diversos players (detesto este anglicismo!) para se adaptarem a uma nova realidade.
Num ambiente de estabilidade dos combustíveis e do parque produtor (meça-se esta estabilidade em anos), a transição deve ser tão rápida quanto os preços e os regulamentos reflictam a situação de mercado livre. Nestas circunstâncias, ao abrir o mercado, a liberdade de escolha por parte dos clientes e a agressividade tecnológica e comercial encarregar-se-ão de pressionar os preços para o mínimo possível (os preços tenderão a igualar o custo marginal de produção, transporte e distribuição).
Acontece que, no regime actual, quando se dá um choque no sentido da subida dos preços dos combustíveis os consumidores passam a ser “subsidiados”, pagando muito menos pela electricidade do que o custo de produção e transporte. O inverso também pode ser verdade – uma baixa sustentada dos preços dos combustíveis originaria uma penalização dos consumidores.
Se acontecer um destes desequilíbrios (e actualmente é o que acontece) um dos lados irá sofrer com a abertura repentina dos mercados. Na actual situação, e tal como já anunciado em muitos artigos de jornal, a abertura imediata dos mercados conduziria a uma subida do preço para os clientes finais. Segundo as contas de Sérgio Figueiredo, os custos de produção subiram 15% enquanto os preços apenas acompanharam a inflação (2% mais coisa menos coisa). O défice tarifário terá de ser pago mais cedo ou mais tarde e a total liberalização implicaria que teria de ser pago JÁ!
Como a situação de Espanha é bem pior e a ânsia de controlo do governo espanhol não apresenta melhorias, não me parece sério sugerir a implementação do MIBEL de um dia para o outro. Primeiro há que arrumar a casa.
Quando se transita para um modelo de mercado verdadeiramente livre, as restrições à entrada de empresas produtoras e distribuidoras são levantadas (as que entrarem têm simplesmente de garantir obediência ao regulamento vigente) e os preços passam a variar consoante as leis da procura e oferta.
No meu entender, têm de ser garantidas duas condições para que uma liberalização seja bem sucedida:
1º - A liberalização tem de ser completa. Não é desejável que se levantem as barreiras à entrada de concorrentes e se mantenha o preço fixo ou que se liberalize o preço mas se mantenham as barreiras à entrada. O regulador tem de deixar de ser participante activo no mercado e passar simplesmente a garantir que os regulamentos sejam cumpridos e que as boas práticas de mercado são cumpridas (um papel semelhante ao da CMVM).
O desastre californiano deveu-se ao facto deste ponto não ter sido respeitado: o parque produtor foi liberalizado mas os preços ao consumidor final mantiveram-se fixos. Resultado: o maior incentivo à poupança de energia (o preço) não funcionou, a procura aumentou (os preços assim o convidavam), os potenciais produtores de energia não tinham incentivo a entrar no mercado, e uma parte dos produtores operantes deixaram de ter incentivo a ligar as suas máquinas (o preço recebido era inferior ao custo marginal), a procura excedeu a oferta e o sistema colapsou.*
À luz de notícias recentes, parece que há muita empresa (produtora e distribuidora) que não está disposta a participar no mercado uma vez que o regime fixo de preços é actualmente muito mais apetecível. Aliás, muitos consumidores do regime não vinculado passaram a ir comprar electricidade ao sistema público!
Por outro lado, a liberalização dos preços sem abertura a concorrentes traria seguramente situações de conluio. O conluio em Portugal tem estado bastante à “solta”, como se pode constatar no caso das gasolineiras, sem que ninguém ainda tenha conseguido provar nada.
2º - A liberalização tem de ser progressiva. Tão mais progressiva quanto o impacto dessa liberalização seja prejudicial aos consumidores ou aos produtores. É necessário dar tempo aos diversos players (detesto este anglicismo!) para se adaptarem a uma nova realidade.
Num ambiente de estabilidade dos combustíveis e do parque produtor (meça-se esta estabilidade em anos), a transição deve ser tão rápida quanto os preços e os regulamentos reflictam a situação de mercado livre. Nestas circunstâncias, ao abrir o mercado, a liberdade de escolha por parte dos clientes e a agressividade tecnológica e comercial encarregar-se-ão de pressionar os preços para o mínimo possível (os preços tenderão a igualar o custo marginal de produção, transporte e distribuição).
Acontece que, no regime actual, quando se dá um choque no sentido da subida dos preços dos combustíveis os consumidores passam a ser “subsidiados”, pagando muito menos pela electricidade do que o custo de produção e transporte. O inverso também pode ser verdade – uma baixa sustentada dos preços dos combustíveis originaria uma penalização dos consumidores.
Se acontecer um destes desequilíbrios (e actualmente é o que acontece) um dos lados irá sofrer com a abertura repentina dos mercados. Na actual situação, e tal como já anunciado em muitos artigos de jornal, a abertura imediata dos mercados conduziria a uma subida do preço para os clientes finais. Segundo as contas de Sérgio Figueiredo, os custos de produção subiram 15% enquanto os preços apenas acompanharam a inflação (2% mais coisa menos coisa). O défice tarifário terá de ser pago mais cedo ou mais tarde e a total liberalização implicaria que teria de ser pago JÁ!
Como a situação de Espanha é bem pior e a ânsia de controlo do governo espanhol não apresenta melhorias, não me parece sério sugerir a implementação do MIBEL de um dia para o outro. Primeiro há que arrumar a casa.
* - Convém explicar esta especificidade dos sistemas eléctricos: até um certo ponto, se houver desequilíbrios entre a procura e a oferta, o sistema não funciona para ninguém! Veja-se o exemplo do apagão de Maio de 2000, em que a rede da zona Sul de Portugal ficou isolada da zona Norte (maldita cegonha!) – como nesse momento apenas a central de Sines estava a operar na zona Sul e esta não tem potência nem flexibilidade para aguentar todo o consumo a Sul do Tejo (na altura também não existiam pontos de interligação com Espanha a Sul do Tejo); o sistema colapsou com as consequências que todos sabemos.
2 Commets:
muito bem...
Fala quem sabe, aprende quem quer.
Bela(s) posta(s). Abraço.
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