17 abril 2008

Eleanor Rigby


Recomenda-se a leitura desta posta do alf no outramargem.

«Só que não é assim. As orquestras não nascem por causa dos ouvintes. As orquestras nascem por causa dos músicos. Os músicos que querem tocar é que formam orquestras. Orquestras, coros, agrupamentos musicais, conjuntos de rock.»

A posta levanta questões interessantes sobre qual será o "motor" da actividade económica. Os exemplos das actividades musicais são felizes. Bem... mas se calhar convinha dar aqui uma pequena machadada na imagem idílica que temos das orquestras. A um nível profissional, ser músico de orquestra é tão romântico como a de relojoeiro ou de cirurgião. Será romântico durante os 60 a 120 minutos que duram as récitas mas mesmo assim... É necessário tocar durante longos minutos sem erros, ter uma grande disciplina de estudo, estudar muitas horas, absorver as (muitas) indicações do maestro (patrão) durante os ensaios assimilando a sua visão das obras, compreender as obras, não falhar notas, tocar muita música de que não se gosta fingindo o contrário, etc... A um nível alto, só os muito melómanos têm estofo para a profissão e se sentem realizados. Será assim tão diferente quanto outras profissões?

Quanto às bandas pop/rock/rap/afins, o exemplo é bem mais feliz. É, de facto, uma área em que a vontade de criar dita as regras. Só que não deixarão de ser um passatempo se a qualidade do que produzem não for de encontro aos gostos (necessidades) do público. Sendo um passatempo, quem exerce essa actividade acaba também por ser consumidor do que produz. As grandes bandas de rock vivem da adrenalina que os concertos lhes causam e do prazer de satisfazer um público. Quando isso deixa de acontecer as coisas complicam-se.

Há portanto um equilíbrio entre a vontade de quem cria e de quem consome. Não basta querer produzir para que isso seja sustentável. Muitas boas ideias falharam porque não foi possível torná-las apetecíveis o suficiente para que houvesse massa crítica que as sustentasse. Outras vezes só são boa ideia para quem a tem... Isso também é válido para as orquestras.

Produzir por produzir não gera riqueza. Só criando valor para quem consome é que se cria riqueza. Isto é igualmente válido para bandas. Os Madredeus começaram como um grupo de amigos que se juntava para "mudar de ares" dos seus outros projectos. Quando se aperceberam que havia um número crescente de curiosos que vinha até à sala de ensaios para os ouvir é que eles se aperceberam que se calhar o projecto poderia ter outra dimensão. Apostaram numa vocalista, deram uns concertos, gravaram um LP e depois... já conhecem a história.


Father McKenzie writing the words of a sermon that no one will hear
No one comes near. Look at him working. darning his socks in the night when there's nobody there What does he care?
"Eleanor Rigby", The Beatles