18 março 2007

O filme Gore


Hoje (finalmente!...) vi o “documentário” de Al Gore. Documentário está entre aspas porque no fundo mistura tempo de antena político com documentário. Noutras circunstâncias seria facilmente classificado de propaganda. Mas o status quo e os méritos do próprio filme, evitam essa leitura à maioria dos espectadores.

Para mim a promoção da figura de Al Gore é por demais evidente. Os apartes sobre o atropelamento do filho, sobre os touros que ajudava a criar e do tabaco que ajudava a colher em criança, sobre a morte da irmã devido a cancro do pulmão, sobre a derrota eleitoral (que drama!) frente a G.W.Bush em 2000, são completamente irrelevantes para o tema do aquecimento global. Mas o documentário encaixa estes apartes com competência criando tensões e formando a imagem do nosso simpático apresentador.

Refira-se que, do ponto de vista cinematográfico e do ritmo, o documentário é muito bom (daí o Óscar?). Fiquei com pena de não o ter visto no cinema.

Na minha leitura, o documentário pretende transmitir 5 grandes ideias:


- O clima está a mudar

- Está a mudar devido à acção humana

- O mundo científico é unânime acerca do aquecimento global

- Os políticos são (os únicos) capazes mudar o terrível destino que se avizinha

- Al Gore é um deles

Para mostrar que o clima está em mudança (acelerada) Al Gore usa todo o tipo de exemplos, num exercício de sábio cherry-piking, que vão desde gráficos, ao recuo dos glaciares até às migrações de aves. Parece que não existe nenhum fenómeno natural desagradável que não se tenha devido ao aquecimento do globo. Nem os que antes eram tido como normais. Exemplo mais flagrante: os furacões. No meio disto tudo, Al Gore não se esquece de demonstrar alguma autoridade na matéria da climatologia explicando os mecanismos climáticos. Nesse ponto o documentário parece ser útil para quem nunca ouviu falar do assunto. Alerta-se para sinais existentes ao nível do desaparecimento de algumas espécies - bichinhos fofinhos (voz dengosa) - e da súbita proliferação de outros - insectos horripilantes portadores de temíveis doenças (voz cavernosa) o que denota alguma selectividade cognitiva ou, alternativamente, uma vontade de manipular. Os exemplos de alterações assentam na observação de dinâmicas que vão de 6500 anos até 35 dias. É à vontade do freguês.

Para apoiar a crença de que o Homem é responsável por estas alterações, Al Gore focaliza-se obsessivamente no CO2. Quem nunca tenha lido nada sobre o assunto sai plenamente convencido de que só o CO2 é responsável pela variação do efeito de estufa e , consequentemente, pelas supostas alterações no clima. Não se fala nem do vapor de água, nem do metano, nem da actividade vulcânica, nem da actividade solar, nem das irregularidades orbitais da Terra. Aí eu desculpo mais o prezado ex-futuro-candidato a presidente. É normal cada cientista achar que a sua especialidade é mais útil à humanidade que as outras. Se fosse musicólogo, talvez estabelecesse um nexo de causalidade entre a proliferação de percussões na música e a temperatura na Terra.

Para ganhar crédito, Al Gore arrasa com os opositores das ideias que defende. Diz que não existe nenhum artigo publicado que contrarie a tese do aquecimento global por razões antropogénicas (desculpe?????) e, subliminarmente, compara essa ameaça à ameaça nazi. Todos os cépticos do aquecimento global estão a soldo de multinacionais do ramo petrolífero. Toma e embrulha! Esquece-se de que também já existe uma “indústria” em torno do aquecimento global: a investigação e os gabinetes de ambiente também precisam de big bucks.


Juntamente com esta ideia ainda vende outra: a de que os problemas na Terra são fruto da política e se resolvem com… política. Uma que me fez rir foi quando conta como se emocionou ao ver uma amostra de gelo polar onde era visível a entrada em vigor de uma lei ambiental (alguém me é capaz de lembrar qual?) que ele ajudou a aprovar (desculpe????). A mensagem inicial é a de que o ambiente depende da política. Essa ideia vai sendo repetida interpoladamente ao longo do documentário sendo que, para mim, o auge é atingido num pequeno cartoon em que se ilustra uma experiência científica. Para quem não viu, eu explico: quando uma rã é metida num recipiente com água muito quente ela salta cá para fora; mas quando ela é mergulhada num recipiente com água fria e depois se começa a aquecer, a rã não reage até ser cozida. Mas Al Gore não cai no erro de mostrar, nem num cartoon, uma rã cozida. Logo aparece uma mão que retira a rã do recipiente e a devolve à liberdade (uma espreguiçadeira sob um chapéu-de-sol numa praia) e Al Gore diz algo como “We must never let the frog die”. E assim se resumem as duas últimas ideias-chave que enunciei: só a mão salvadora de um bom político poderá salvar a estúpida mas simpática de uma fatalidade pela qual não é responsável nem consciente. Só entregando-nos nestas mãos tão humanas nos salvaremos a nós e aos nossos filhos e netos. OK! 10 minutos para irem buscar um lenço e acabar de ler a posta.

……

Felizmente Gore não desce tão baixo ao ponto de dar personalidade à Terra – qual bichinho fofinho à beira da extinção. O enfoque ecológico é, a meu ver mais saudável e menos infantil do que é vulgar encontrar em propaganda do género. O enfoque é posto no Homem enquanto principal interessado em manter o ambiente onde vive o mais aprazível possível. Que deve cuidar do planeta como cuida da sua casa. Que é mais vantajoso para si utilizar os recursos naturais com racionalidade e assumindo uma perspectiva de longo prazo. Mas, ao contrário de Al Gore, não acredito que acção política possa contribuir para isso de forma eficiente.

4 Commets:

Blogger Unknown said...

Que grande post!
Fiquei muito triste de ainda nao ter visto essa banhada, mas pensando outra vez, depois de resumo de tao grande qualidade, acho que ja nao preciso de o ver.

10:39 da tarde  
Blogger Unknown said...

Este comentário foi removido pelo autor.

10:39 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Claro que isso vai da conscientização de cada um, mas se os políticos ligassem um pouco mais pro meio ambiente, talvez desse pra dar uma melhorada, foi isso que ele quis dizer :D
Documentário muito bom o dele, e bem verdadeiro sim :/

1:17 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Oi!!Prazer meu nome é Edgar adorei seu blog e sua postagem ...tudo de exelente qualidade...Gostaria de fechar uma parceria caso fosse de seu interesse também...www.planetaabandonado.blogspot.com
Amplexos Libertários

10:42 da tarde  

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