Questões de representatividade
Após o furacão Katrina tornou-se um lugar comum que o aquecimento global leva a um aumento do número e intensidade das tempestades tropicais. Nos artigos que pululam na imprensa, apresentam-se gráficos que ilustram o evoluir da situação nos últimos anos e onde se pode ver a “clara” tendência. Motivado pelo artigo do João Miranda no Blasfémias e investigando no Wikipedia, encontrei um gráfico que ilustra a evolução da intensidade dos ciclones nos últimos 55 anos:
Acontece que se pegar na sub-amostra referente à década de 50, a conclusão seria a oposta.
A preto temos a intensidade “total” dos ciclones em cada ano medida pelo indicador ACE (ver artigo do wikipedia para mais pormenores). A vermelho temos a intensidade média dos ciclones em cada ano.
O que se observa é um fenómeno de grande variabilidade e como tal é necessário recolher muita informação (entendam-se: observações) para que se possa afirmar que este está a assumir esta ou aquela tendência. A evolução tecnológica global não parece ter tido qualquer efeito no fenómeno dos ciclones no período analisado. Será que o vai ter num futuro mais ou menos próximo? Neste caso não se pode admitir que exista uma clara tendência parecendo-me que, com base nestes dados, o fenómeno dos ciclones é estável. Existe a hipótese de existirem ciclos relativamente longos, mas as observações não são suficientes para retirar essa conclusão. Uma amostra maior poderia dar-nos uma visão diferente.
O que se observa é um fenómeno de grande variabilidade e como tal é necessário recolher muita informação (entendam-se: observações) para que se possa afirmar que este está a assumir esta ou aquela tendência. A evolução tecnológica global não parece ter tido qualquer efeito no fenómeno dos ciclones no período analisado. Será que o vai ter num futuro mais ou menos próximo? Neste caso não se pode admitir que exista uma clara tendência parecendo-me que, com base nestes dados, o fenómeno dos ciclones é estável. Existe a hipótese de existirem ciclos relativamente longos, mas as observações não são suficientes para retirar essa conclusão. Uma amostra maior poderia dar-nos uma visão diferente.
Agora, quando se olha para uma amostra reduzida, as conclusões podem-se alterar radicalmente e quando isso acontece deliberadamente estamos perante uma das duas realidades: iliteracia científica ou manipulação de informação. Vejamos um exemplo simples.
Se pegar na sub-amostra a 1985-2005 obtenho o seguinte gráfico:
Se pegar na sub-amostra a 1985-2005 obtenho o seguinte gráfico:
A partir deste posso escrever um extenso artigo em que provo, por A+B, que a potência de devastação dos ciclones está a aumentar. Ao tentar encontrar causas, vou à Internet e encontro um vasto número de artigos que suporta que a actividade humana tem sério impacto nas temperaturas, efeito de estufa e perturbações climáticas (por ex: El Niño). Logo, seguindo um percurso lógico, juntaria este dado a um rol de outros tantos que suportam que há dramáticas alterações climáticas em curso. Claro que os artigos em que se admite haver correlação entre o aquecimento global são bem mais abundantes dos que a negam. Posso inclusive comparar as sub-amostras de 1995 e 2005 com a sub-amostra de 1970-1978. A média da segunda é claramente inferior à da primeira. Claro como a água.
Acontece que se pegar na sub-amostra referente à década de 50, a conclusão seria a oposta.
Como esta tendência até seria boa (para uma vasta maioria) o facto não seria notícia. E daí talvez não! Na década de 70 havia uma séria preocupação com evidência de que poderia estar eminente uma nova era glaciar. Talvez este gráfico tenha sido apresentado na altura…
Com a temperatura média global passa-se algo semelhante. Na CRU da Universidade de Anglia poderão ser consultados os dados referentes aos desvios da temperatura média do ar e do mar face à média registada entre 1960 e 1991.
Com a temperatura média global passa-se algo semelhante. Na CRU da Universidade de Anglia poderão ser consultados os dados referentes aos desvios da temperatura média do ar e do mar face à média registada entre 1960 e 1991.
Porquê considerar 1960 a 1991 e não outro período? A FAQ da página do CRU não explica.
Olhando para os últimos 20 anos pode ver-se que há uma clara tendência positiva. Mas mais alarmados deveria estar que olhou para o gráfico (se isso fosse possível) em 1940. Nem imagino a angústia! Mas o que é certo é que a situação estabilizou por completo (contrariando a tendência 1910-1940) durante 40 anos! E no período de maior desenvolvimento industrial da História (1945-1970)!
Tomando a média 1960-1991 como “boa”, diria que a situação actual não é mais preocupante do que a que se viveu nos 100 anos anteriores. Depois, só muito pontualmente estas anomalias ultrapassaram os 0,5ºC. O que importa realçar é que, com base nestes dados e na restrição do período amostral, pode-se demonstrar quase tudo. Neste momento a grande paixão parece ser a defesa do planeta contra o aquecimento da Terra.
Não tenho nada contra quem defenda que possamos estar perante um fenómeno de aquecimento global com origem na actividade humana. Com base nos dados, não me aterevo a desmentir categoricamente essa hipótese. Mas também não me consigo convencer do oposto.
O debate das alterações climáticas tem-se tornado cada vez mais apaixonado, com tendências maniqueístas e algum idealismo à mistura. Eu preferia um debate desapaixonado com base em Ciência e sem conotações politico-ideológicas mas compreendo que não teria tanta piada e se resumiria a uma questão tão académica como a utilização (ou não) do procedimento de Perron na identificação dos Processos Geradores de Dados de séries com raízes unitárias. Uma seca… E não vende (tele)jornais e não dá tantos empregos.
Sou mais virado para o ambientalismo preocupado com uma utilização eficiente dos (escassos) recursos naturais e da sua correcta valorização. Esse ambientalismo é mais consequente do que o ambientalismo de fábulas e papões. Este último já identificou os mauzões e preconiza soluções de Estado para os resolver.
O ambientalismo da racionalidade é mais chato e menos visível. Mais chato porque nos implica a todos (a começar por mim que me esqueço da luz acesa) e não aos outros. E menos visível porque reparte as “culpas”. Uma central nuclear dá mais nas vistas que os jipes, em que os dirigentes ambientalistas se deslocam habitualmente, mas desperdiça e polui (proporcionalmente) bem menos.
Olhando para os últimos 20 anos pode ver-se que há uma clara tendência positiva. Mas mais alarmados deveria estar que olhou para o gráfico (se isso fosse possível) em 1940. Nem imagino a angústia! Mas o que é certo é que a situação estabilizou por completo (contrariando a tendência 1910-1940) durante 40 anos! E no período de maior desenvolvimento industrial da História (1945-1970)!
Tomando a média 1960-1991 como “boa”, diria que a situação actual não é mais preocupante do que a que se viveu nos 100 anos anteriores. Depois, só muito pontualmente estas anomalias ultrapassaram os 0,5ºC. O que importa realçar é que, com base nestes dados e na restrição do período amostral, pode-se demonstrar quase tudo. Neste momento a grande paixão parece ser a defesa do planeta contra o aquecimento da Terra.
Não tenho nada contra quem defenda que possamos estar perante um fenómeno de aquecimento global com origem na actividade humana. Com base nos dados, não me aterevo a desmentir categoricamente essa hipótese. Mas também não me consigo convencer do oposto.
O debate das alterações climáticas tem-se tornado cada vez mais apaixonado, com tendências maniqueístas e algum idealismo à mistura. Eu preferia um debate desapaixonado com base em Ciência e sem conotações politico-ideológicas mas compreendo que não teria tanta piada e se resumiria a uma questão tão académica como a utilização (ou não) do procedimento de Perron na identificação dos Processos Geradores de Dados de séries com raízes unitárias. Uma seca… E não vende (tele)jornais e não dá tantos empregos.
Sou mais virado para o ambientalismo preocupado com uma utilização eficiente dos (escassos) recursos naturais e da sua correcta valorização. Esse ambientalismo é mais consequente do que o ambientalismo de fábulas e papões. Este último já identificou os mauzões e preconiza soluções de Estado para os resolver.
O ambientalismo da racionalidade é mais chato e menos visível. Mais chato porque nos implica a todos (a começar por mim que me esqueço da luz acesa) e não aos outros. E menos visível porque reparte as “culpas”. Uma central nuclear dá mais nas vistas que os jipes, em que os dirigentes ambientalistas se deslocam habitualmente, mas desperdiça e polui (proporcionalmente) bem menos.
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